O reconhecimento da possibilidade jurídica de recusa à transfusão de hemoderivados por convicção religiosa: Tema 1.069 do supremo Tribunal Federal

Autores

DOI:

https://doi.org/10.17765/2176-9184.2025v25.e13925

Palavras-chave:

Autonomia da vontade, Direitos fundamentais, Liberdade de crença, Recusa terapêutica

Resumo

CONTEXTUALIZAÇÃO: O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 1.212.272, fixou a tese do Tema 1.069 de repercussão geral, consolidando entendimento acerca da licitude da recusa de transfusão de hemoderivados por convicções de natureza religiosa, estabelecendo limitação ao exercício da autodeterminação exclusivamente em favor do manifestante capaz. Este contexto evidencia a crescente judicialização de demandas envolvendo a recusa de tratamentos médicos em razão de motivações religiosas, particularmente em casos de transfusão de hemoderivados, reconhecendo a fé como manifestação profunda da liberdade individual e dimensão essencial dos direitos da personalidade e dos direitos fundamentais.

OBJETIVO: Examinar os contornos jurídicos e os limites da autonomia privada e da autodeterminação informada do paciente em casos de recusa de transfusão de hemoderivados por motivações religiosas, analisando a eventual colisão entre direitos fundamentais: de um lado, a liberdade religiosa e a dignidade da pessoa humana; de outro, o direito à vida e à saúde.

METODOLOGIA: Pesquisa empírica, qualitativa e exploratória, com enfoque na pesquisa bibliográfica, normativa e jurisprudencial, utilizando a técnica da ponderação de princípios como instrumento para solução dos conflitos entre direitos fundamentais.

RESULTADOS: A pesquisa demonstrou uma quebra paradigmática no ordenamento jurídico, reconhecendo-se a prevalência da autonomia embasada na convicção religiosa em relação ao direito à vida. Conclui-se que, diante da complexidade dos valores envolvidos, a técnica da ponderação de princípios apresenta-se como instrumento adequado para a solução dos conflitos, permitindo ao julgador aferir, no caso concreto, qual direito deve prevalecer, sem hierarquização abstrata e absoluta entre eles.

Biografia do Autor

Matheus Massaro Mabtum, Centro Universitário Unifafibe

Doutor em Direito Civil na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC/SP. Mestre em Direito pela Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho" - UNESP. Professor do Curso de Graduação em Direito do Centro Universitário Unifafibe. Advogado e parecerista. 

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Publicado

2025-08-12

Como Citar

Mabtum, M. M. (2025). O reconhecimento da possibilidade jurídica de recusa à transfusão de hemoderivados por convicção religiosa: Tema 1.069 do supremo Tribunal Federal. Revista Jurídica Cesumar - Mestrado, 25(1), 240–257. https://doi.org/10.17765/2176-9184.2025v25.e13925

Edição

Seção

Artigo Original